O juiz André Vaz Porto Silva, titular da 1ª Vara Criminal da Comarca de Barra Mansa, no Sul do Estado do Rio, se inspirou numa música da banda de rap-metal americana Rage Against The Machine, conhecida por suas letras de protesto, para absolver um réu dos crimes de desacato e desobediência. Na epígrafe — frase geralmente usada no início de um livro para resumir ou situar o leitor — da decisão, o magistrado escreveu: “Fuck you / I won’t do what you tell me” (Foda-se, não vou fazer o que você manda, em tradução livre).
Na ocasião, o réu Welington André Ferreira era acusado por dois policiais de “ter se recusado a obedecer ordem dos PMs no sentido de encostar na parede para ser revistado, e por tê-los desacatado ao dizer ‘vão se foder, eu conheço meus direitos, vão tomar no cu, seus filhos da puta’”.
O juiz não se convenceu com os depoimentos dos PMs, que, segundo ele, apresentava inconsistências. “Constato que a ordem emanada dos policiais — para que o acusado assentisse com sua revista pessoal — revestiu-se de duvidosa legalidade”, escreveu o magistrado, para depois completar: “Regras corruptas não merecem obediência”.
André Vaz Porto Silva ainda cita na decisão um informe da Comissão Americana de Direitos Humanos (CADH) e alega que a tipificação de crime de desacato “viola a liberdade de expressão tutelada pela CADH” para, em seguida, finalizar: “faz-se mister afastarmos de nosso jardim os obstáculos que impedem o sol e a água de fertilizar a terra, pois logo surgirão plantas de cuja existência eu sequer suspeitava”.
Réu já foi condenado por tráfico
O réu absolvido pelo magistrado de Barra Mansa já havia sido condenado pelo crime de tráfico de drogas na mesma comarca. Em 2008, Welington André Ferreira foi condenado a seis anos e seis meses de prisão, após ser preso tentando vender cocaína para dois compradores no município do Sul Fluminense. Quando foi preso por dois policiais, Welington ainda tentou fugir e jogar fora os sacos com cocaína.
Em depoimento na delegacia, Welington alegou que foi vítima de um “flagrante forjado”: “antes da abordagem, os policiais teriam ido até uma bolsa e lá teriam pego a droga que está acusando o depoente como sendo o seu dono; que é usuário de cocaína; que no dia dos fatos tinha usado droga, mas não tinha nenhuma em seu poder”, afirmou. Entretanto, a tese não foi aceita em juízo.
Na decisão de agosto, o magistrado argumentou que as abordagens policiais têm motivações “racistas e classistas”: “essa espécie de procedimento, como informam as próprias regras de experiência, marcam o dia a dia da atividade policial, visto materializarem a incidência seletiva do sistema penal em termos de criminalização secundária por seus critérios tipicamente racistas e classistas”.
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