O padrasto de um menino de 3 anos foi condenado a nove anos e 10 meses de prisão em regime fechado por crime de tortura e de maus tratos. Ele queimou várias partes do corpo da criança com um ferro elétrico. A mãe do menino, por sua vez, foi condenada pelo delito de tortura, na modalidade omissiva, a um ano, oito meses e 12 dias de detenção, em regime inicial aberto. A decisão é da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG).
Segundo a denúncia do Ministério Público, o padrasto, E.C., agrediu a criança em 18 de julho de 2010, porque ela havia urinado na cama. O padrasto convivia com a mãe da criança, L.S.P., havia cerca de dois anos. Nesse período, o homem constantemente agredia o menino e os demais enteados, de 8 e 5 anos, infringindo às crianças intenso sofrimento físico e mental, por meio de socos e chutes, chegando a queimar com cigarro o rosto de uma delas.
Ainda segundo o MP, a mãe se revelou omissa em relação aos fatos. Quando o menino foi queimado por ferro, por exemplo, ela só o levou ao posto de saúde no dia seguinte e, chegando lá, mentiu, indicando que o menor tinha sido queimado por um dos irmãos. Suspeitando das agressões, o médico que atendeu a criança chamou a Polícia Militar e o Conselho Tutelar.
Em 3 de maio de 2011, o padrasto foi condenado em Primeira Instância a nove anos e 10 meses de prisão em regime inicial fechado, pelos crimes de tortura e maus tratos, e a mãe do menor a seis meses de detenção em regime inicial aberto, por omissão de socorro. Houve recurso em Segunda Instância, quando a defesa do padrasto tentou desqualificar o crime de tortura e o MP suscitou o incidente de jurisprudência. A 2ª Câmara Criminal aguardava o julgamento do incidente, para que a apelação criminal fosse julgada.
Julgamento do recurso
Em recurso, o Ministério Público insurgiu-se contra a absolvição da mãe pelos crimes de tortura e de maus tratos. A genitora, por sua vez, recorreu de sua condenação por omissão de socorro, e o padrasto pediu absolvição.
Ao analisar os autos, o desembargador relator, Matheus Chaves Jardim, observou que a materialidade dos crimes estava evidenciada por boletim de ocorrência, exame de corpo de delito da vítima, guia de atendimento médico, auto de apreensão e exame médico complementar. A autoria do crime também era inconteste, tendo em vista o conjunto probatório, em especial os relatos dos enteados de E. Manteve, assim, a condenação fixada em Primeira Instância.
No que se refere à mãe, o desembargador afirmou que ela também deveria ser condenada pelo delito de tortura, na modalidade omissiva, porque se manteve inerte diante das condutas praticadas pelo companheiro. Tendo em vista as peculiaridades do caso e o grau de participação da mãe no delito, aumentou a pena dela para um ano, oito meses e 12 dias de detenção, em regime inicial aberto.
Os desembargadores Catta Preta e Beatriz Pinheiro Caires votaram de acordo com o relator.
Incidente de uniformização
Em 2014, a Câmara de Uniformização de Jurisprudência Criminal do TJMG reconheceu a natureza comum do crime de tortura. Isso significa entender que ela pode ser praticada por qualquer pessoa, não sendo necessário que o agressor seja agente público para que o crime seja caracterizado como tortura. A decisão foi publicada em 30 de outubro do ano passado.
O incidente de uniformização, recurso por meio do qual se buscou unificar o entendimento do TJMG sobre o assunto, foi suscitado pela 2ª Câmara Criminal, que acolheu parecer do Ministério Público nesse sentido – o pedido foi feito pelo procurador de justiça Antônio Sérgio Tonet. O objetivo foi fixar o entendimento de que configura crime comum o delito previsto no artigo 1º, inciso II, da Lei 9.455/97 – “submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo”.
Com essa decisão, agressões contra crianças, idosos, deficientes físicos ou enfermos, muitas vezes classificadas como maus-tratos ou lesões corporais, poderão ser qualificadas como tortura, recebendo penas maiores.
Enquanto o incidente de uniformização era apreciado pelo TJMG, todos os processos dessa natureza que estavam na Casa ficaram suspensos, aguardando o julgamento do incidente.
Para preservar a identidade das vítimas, a movimentação processual e o acórdão não serão informados.
FONTE: TJ-MG
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