São raros os momentos em que não vemos a propagação do ódio entre pessoas. Talvez isso só ocorra na hora de apresentar a previsão do tempo, ou de falar sobre esportes (desde que não mostre nenhuma agressão).
Se tem um “assunto da moda”, de preferência envolvendo muito sofrimento e brutalidade, aí é que os jornais só falam sobre isso.
Todos lembramos do caso do caso do esfaqueamento daquela pessoa no RJ, num roubo de uma bicicleta. Quantos outros casos foram noticiados após esse, não só no RJ, mas em outros Estados?
E na época em que a “moda” era explodir/arrombar “caixas rápidos”?! Só se falava nesse tipo de crime.
O mais “engraçado” disso tudo é que a maior parte dos crimes que são noticiados acabam sendo repetidos, inclusive na forma de atuação, passoapasso.
Assim, mais parece que os telejornais, ao invés de prestar um bom serviço à sociedade, se tornaram uma escola do crime.
Não sabe como praticar determinado crime?! Assista aos telejornais, pois eles te dirão como fazer!
Vamos ao exemplo do “caixa rápido”.
Aqui no ES, há uns anos, “entrou na moda” invadir estabelecimentos comerciais no período da noite (quando estava fechado), com um veículo de carroceria, e levar embora o caixa eletrônico do local.
Geralmente, os agentes usavam o próprio veículo para quebrar a entrada do local, entravam de ré até o local do caixa, o colocavam no veículo e fugiam.
Bastou esse crime sair na mídia, com detalhes (forma de atuação, tempo de duração da ação, dentre outros), que pouco tempo depois só se falava nisso e no aumento de roubos/furtos de camionete e pick-ups (utilizadas para transportar o caixa).
E como disse, os crimes, surpreendentemente, eram muito parecidos e não necessariamente eram praticados pelas mesmas pessoas.
A violência está tão grande e tão espalhada que não precisamos desse (des)“incentivo”. Eu, pelo menos, dispenso.
Na verdade, o mais triste nem é ver essas aulas da prática criminosa passando 24h na TV. O pior mesmo é saber que se isso é tão noticiado é que tem público para assistir (ô se tem!).
1. O conceito de democracia nos leva a perguntar: “Quem governa e como se governa”? Essas são as duas perguntas-chaves para se compreender as formas de governo. Para Aristóteles (385 a. C. – 322 a. C) haveria três formas de governo:monarquia (governo de um só), aristocracia (governo dos melhores) e a politeia(governo de muitos). Ainda para Aristóteles, as formas degradadas desses três modelos (degradadas por interesses pessoais e privados dos humanos, que são colocados acima dos interesses gerais) seriam (respectivamente): a tirania, aoligarquia e a democracia (cf. A Wikipedia). A democracia, como se vê, era vista de forma negativa, como expressão dos demagogos e aduladores do povo. De qualquer modo, a democracia seria a melhor forma degradada (ou seja: a melhor dentre as piores).

3. Políbio (203 a. C – 120 a. C.) fez dois importantes ajustes na teoria das formas de governo então vigorantes: substituiu politeia por democracia (governo do povo, que passa a ser algo positivo) e sublinhou que o vício desta seria a oclocracia (governo das massas irracionais). Elas se sucedem, historicamente, conforme o ritmo de cada momento (visão fatalista da História): monarquia/tirania, aristocracia/oligarquia, democracia/oclocracia.
4. Pode-se dizer que todas essas formas de governo nós já vivenciamos no Brasil. Já fomos monarquia e tirania ao mesmo tempo (1500-1822), já fomos aristocracia e oligarquia (1822-1930) – a oligarquia rural nos governou durante a República Velha (1894-1930) e, desde 1985, somos uma democracia (sobretudo formal, mas democracia), porém, uma das mais viciadas e venais do mundo. Além de virtuosos que somos (a luta pela democracia custou muitas vidas), tudo quanto é vício também paira sobre os ares brasiliensis (como veremos em outro artigo).
5. Na teoria somos uma democracia constitucional (os direitos e garantias mais relevantes estão previstos na Constituição). Na prática, nossa democracia é preponderantemente eleitoral ou procedimental: um grande universo de eleitores pode votar a cada quatro anos. Mas ter o direito de votar não significa ter o direito de mandar, de governar, de dividir o orçamento público de acordo com os interesses gerais.
6. Apesar de todos os avanços, particularmente nos últimos 50 anos (veja Arrecthe,Trajetória das desigualdades), estamos muito longe de ser uma democracia cidadã(que repeita os direitos e garantias de todos). Uma coisa é escrever os direitos das pessoas no papel (seguramente de forma bem intencionada). Outra bem distinta é fazer valer os direitos que estão nesse papel (no “livrinho”, como diria o ex-presidente Dutra).
7. A democracia, por mais auspiciosos que sejam seus ventos, não traz consigo (automaticamente) uma boa higienização do ambiente empesteado pelos seus vícios (sobretudo os pecuniários). Os bacilos (bactérias) das grandes pestes da democracia aqui nunca foram bem dedetizados. Na verdade, como lembrava Rieux (o médico da cidade empestada de A. Camus, A peste), os bacilos não morrem: “o bacilo da[s] peste[s] não morre nem desaparece nunca, pode ficar dezenas de anos adormecido nos móveis e na roupa, espera pacientemente nos quartos, nos porões, nos baús, nos lenços e na papelada”. As pestes voltam até mesmo nas cidades (países) felizes, que nem bem terminam de comemorar um progresso (foi o caso da nossa redemocratização de 1985) e já se veem novamente atacadas pelos imortais e resistentes bacilos.
8. A relação entre o dinheiro e o poder viola o mantra da igualdade democrática veiculado no refrão “cada cabeça um voto”. Nas velhas e novas democracias liberais (democracias contemporâneas) temos os eleitores e os super eleitores. No nosso caso são super eleitores as empreiteiras, bancos, empresas de bebidas e de mineração, de agronegócio, de produtos alimentícios etc. Duas classes emergem desse sistema: classes dominantes e classes subdominantes. Os donos do poder econômico-financeiro são, de fato, as classes dominantes; os políticos, os governantes e os agentes públicos de alto escalão são subdominantes. Assim sempre foi (na nossa História com certeza). Nada de novo sob o sol.
9. O poder (no nosso entorno), consequentemente, sempre esteve concentrado nas mãos de poucos. A democracia (muitos votam) é uma máscara, um verniz, uma tintura (mas dela não podemos prescindir porque é só o que resta para as minorias lutarem pelos seus direitos). Seus custos entram nos balanços de quem financia as campanhas. Seus procedimentos são caros, mas sempre existe alguém que paga a conta. Tudo isso, de qualquer modo, é muito menos custoso que a violência para assumir o poder. Como a democracia, na cultura ocidental, está fora de discussão, os que detêm o poder (classes dominantes e subdominantes) nos governam por meio dela, comprando-a. A democracia, para os que mandam, virou um produto. Eles não podem usurpar diretamente o poder e prescindir dos votos dos eleitores. Sendo assim, estes (em geral) ou são comprados ou são manipulados.
[1] CANFORA, Luciano e ZAGREBELSKY, Gustavo. La maschera democrática dell’oligarchia. Roma: Editori Laterza, 2014, p. 7-8.
[2] CANFORA, Luciano e ZAGREBELSKY, Gustavo. La maschera democrática dell’oligarchia. Roma: Editori Laterza, 2014, p. 8.